Responsabilidade do Gerente em caso de Falência da empresa


Os administradores ou gerentes de uma sociedade comercial tem deveres, adstritos às usas funções, cujo incumprimento origina a sua responsabilização.
Em primeiro lugar, existe responsabilidade do administrador ou gerente pelo pedido infundado de insolvência, conforme o prevê o artigo 22.º do CIRE que dispõe que “a dedução de pedido infundado de declaração de insolvência, ou a indevida apresentação por parte do devedor, gera responsabilidade pelos prejuízos causados ao devedor ou a terceiros, mas apenas em caso de dolo.
Acresce que, outro dever que impende ao administrador ou gerente é o dever de apresentação à insolvência, nos termos do artigo 18.º CIRE, o qual prevê um dever de apresentação à insolvência no prazo 60 dias a partir da data do conhecimento da situação de insolvência.
Sendo que, para existir responsabilidade do administrador ou gerente da sociedade pela falta de apresentação à insolvência no prazo supra indicado, é necessário que estejam preenchidos os seguintes pressupostos:
a) A ilicitude do facto gerador de responsabilidade civil, ou seja, a violação por ação ou omissão, de qualquer dever que impenda sobre os administradores e gerentes;
b) A culpa que é igualmente essencial, embora no caso da responsabilidade para com a sociedade se presuma a existência de culpa, pelo que é necessário ao administrador ou gerente provar que agiu sem a mesma;
c) A existência de um dano;
d) A existência de um nexo de causalidade entre a conduta ilícita e o dano.
No entanto, a culpa dos administradores e gerentes não se pode presumir, pelo que, os interessados terão de fazer prova da sua existência, para além da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil.
No âmbito de um processo de insolvência, a principal responsabilidade do administrador ou gerente advém do resultado do incidente de qualificação de insolvência, ou seja, se a mesma é considerada fortuita ou culposa.
Com a sentença de declaração de insolvência inicia-se o incidente de qualificação da insolvência do devedor que permite classificá-la como fortuita ou culposa e averiguar se houve responsáveis pela situação.
Para efeitos de responsabilidade e imputação de culpa, prevê o disposto no artigo 186.º, n.º 2 do CIRE a verificação das seguintes circunstâncias, que aqui se transcreve:
a) Incumprimento da obrigação de manter a contabilidade organizada, produção de uma contabilidade fictícia ou de dupla contabilidade ou contribuição para a ocorrência de irregularidade que prejudique a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor;
b) Incumprimento do dever de requerer a declaração de insolvência nos 60 dias seguintes ao conhecimento do incumprimento das obrigações tipificadas na lei;
c) Incumprimento da obrigação de elaborar, no prazo legal, contas anuais e de as submeter à fiscalização ou de as depositar na Conservatória do Registo Comercial.
O incidente de qualificação pode abranger terceiros que atuaram em conjunto com o devedor insolvente, sendo o nível de diligência exigido o mesmo, ou seja, terá que se provar que o mesmo agiu com dolo ou culpa grave para que possa ser responsabilizado.
No plano processual o incidente de qualificação culposa segue os seguintes trâmites legais:
  1. Qualquer interessado na qualificação pode alegar por escrito e até 15 dias depois da assembleia de apreciação do relatório o que tiver por conveniente;
  2. Dentro do prazo de 15 dias, o administrador de insolvência emite parecer fundamentado sobre os factos alegado no requerimento e caso considere a insolvência como culposa deve identificar as pessoas que devem ser afetadas pela qualificação;
  3. O parecer é depois remetido para o Ministério Publico para se pronunciar no prazo de 10 dias;
  4. Se o ministério público e o administrador emitirem pareceres no sentido de considerar a insolvência fortuita, é de imediato proferida decisão e encerrado processo;
  5. Se for proposta a insolvência culposa pelo Ministério Público ou pelo administrador de insolvência são citadas as pessoas que possam ser afetadas pela qualificação para se oporem no prazo de 15 dias;
  6. No caso de ser apresentada oposição, pode ainda qualquer interessado apresentar resposta no prazo de 10 dias.

Acresce que, em simultâneo ao incidente de qualificação da insolvência existe um dever por parte do juiz do processo em dar conhecimento ao Ministério Público de factos que indiciam a prática de crimes, para efeitos de responsabilidade penal.
A situação de insolvência não é suscetível de configurar a prática de crimes por parte de pessoas coletivas, mas poderão ser responsabilizados criminalmente as pessoas singulares titulares dos seus corpos sociais.
Assim, dispõe o previsto no artigo 227.º do Código Penal que:
1 – O devedor que com intenção de prejudicar os credores:
a) Destruir, danificar, inutilizar ou fizer desaparecer parte do seu património;
b) Diminuir ficticiamente o seu activo, dissimulando coisas, invocando dívidas supostas, reconhecendo créditos fictícios, incitando terceiros a apresentá-los, ou simulando, por qualquer outra forma, uma situação patrimonial inferior à realidade, nomeadamente por meio de contabilidade inexacta, falso balanço, destruição ou ocultação de documentos contabilísticos ou não organizando a contabilidade apesar de devida;
c) Criar ou agravar artificialmente prejuízos ou reduzir lucros; ou
d) Para retardar falência, comprar mercadorias a crédito, com o fim de as vender ou utilizar em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente;
é punido, se ocorrer a situação de insolvência e esta vier a ser reconhecida judicialmente, com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
2 – Se a falência vier a ser declarada em consequência da prática de qualquer dos factos descritos no número anterior, o devedor é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.”
Ora, a qualificação de insolvência como culposa tem como consequência para as pessoas afetadas pela sentença, a inabilitação, a fixar entre 2 a 10 anos, a sua inibição, pelo período de 2 a 10 anos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de órgão de sociedade comercial ou civil, associação, fundação, empresa pública ou cooperativa.
Implica também a perda de quaisquer créditos sobre a massa insolvente detidos pelas pessoas afetadas pela qualificação e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos em pagamento desses créditos e ainda a obrigação de registo oficioso da inabilitação ou inibição na Conservatória do Registo Civil ou do Registo Comercial com base em certidão da sentença remetida pela secretaria judicial.
Sendo que, os administradores e gerentes são ainda responsáveis penalmente pela situação de insolvência, se esta for provocada pela sua atuação dolosa ou por mera negligência, sendo ainda um fator de imputação de responsabilidade penal o favorecimento de certos credores ou se após a declaração de insolvência os gerentes praticarem algum ato que fruste os créditos contra a massa insolvente.
Ainda no que diz respeito à responsabilidade dos gerentes, importa verificar a sua responsabilização tributária.
Sendo que conforme o disposto no artigo 88.º, n.º 1 do CIRE que “a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelo credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer ação executiva instaurada pelos credores da insolvência, porém se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.”
Isto significa que em processos de execução fiscal pendentes, não poderão ser efetuadas novas penhoras, mesmo que já, ordenadas, nem poderão ser concretizados quaisquer procedimentos cautelares ou efetuadas vendas, após o conhecimento da insolvência pelas entidades competentes onde correm as execuções.
Sendo que, os administradores e gerentes serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas tributárias quando, por atuação dolosa da sua parte, os créditos tributários não tenham sido liquidados e o património da sociedade seja insuficiente para cumprir aquelas obrigações, sendo que estes créditos serão pagos através do património pessoal dos gerentes e administradores.


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