Acidente de trabalho / Acidente de viação
I. Deduzida numa contestação a excepção de prescrição do direito peticionado, tem a autora o ónus de na réplica alegar a excepção a essa excepção consistente na interrupção do prazo de prescrição por pendência de acção com o mesmo objecto.
II. Pretendendo uma seguradora num contrato de trabalho o reembolso das prestações mensais que vem pagando a título de pensão de sobrevivência à viúva e filhos menores da vítima mortal em acidente de trabalho que é igualmente de viação e pretendendo o reembolso da seguradora do veículo considerado responsável pelos respectivos danos, tem o prazo de prescrição desse direito de reembolso de três anos contados da data de pagamento de cada uma das prestações efectivamente pagas e não contado da data do pagamento da primeira prestação peticionada.
* Nos termos do art. 663º, nº 7, CPC

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
AA, Companhia de Seguros, S.A. veio propor a presente acção sob a forma de processo ordinário contra a Companhia de Seguros BB, S.A., pedindo, entre o mais, o seguinte:
i) A condenação da ré no pagamento à autora da quantia global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido CC, e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento; e
ii) Subsidiariamente, e para a eventualidade de assim se não entender, ser a ré condenada a pagar à autora a importância global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido CC, e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento, a título de restituição por enriquecimento sem causa justificativa.
Alegou, para tanto, que sob o nº 996/03.0TBALB correram os autos de processo ordinário, nos quais foi proferida sentença a condenar a ré no pagamento à autora da quantia global de € 35.560,77, já transitada em julgado, após confirmação por Acórdãos da Relação de Coimbra e Supremo Tribunal de Justiça juntos aos autos, correspondente ao reembolso de montantes parcelares pagos pela ora autora aos herdeiros da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, até 21/06/2006, no qual se considerou a ré obrigada a proceder ao seu pagamento em virtude de se decidir aí que o acidente de viação e simultaneamente acidente de trabalho, que vitimou a infeliz vítima CC foi causado pelos riscos de circulação do veículo «OB» (ou seja, responsabilidade pelo risco), cujo proprietário havia transferido a responsabilidade civil pela indemnização por danos causados pela circulação do veículo para a ora ré através da apólice nº 1607571; também se decidiu aí que a obrigação do responsável não abrangia as pensões futuras, ou sequer as reservas matemáticas; em cumprimento do ai decidido, a ré procedeu, em 15/11/2011, ao pagamento à autora da quantia de capital de €35.560, 77 acrescido da quantia de € 2.077,14 a título de juros moratórios legais; posteriormente, e reportado ao período compreendido entre 21/06/2006 e até 30/06/2012, a autora despendeu mais €25.009,10 com as pensões devidas à viúva e filhos da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, assistindo-lhe, assim, o direito de ser reembolsada de tais quantias nos mesmos termos do decidido anteriormente nos autos atrás mencionados.
Regularmente citada, a ré Companhia de Seguros BB, S.A. deduziu contestação, na qual se defendendo-se por excepção e por impugnação.
Por impugnação, defende-se por negação directa quanto aos montantes parcelares pagos pela autora aos herdeiros da infeliz vitima.
Por excepção, invocou a prescrição extintiva da obrigação de reembolso das quantias parcelares pagas, por um lado, e que o valor reclamado pela autora, no caso de não se verificar a prescrição extintiva, excede, tendo em conta os montantes já pagos à autora e outros lesados, em consequência do sinistro, em discussão, o limite legal do capital seguro obrigatório automóvel de €600.000,00, em vigor à data do acidente, por outro lado.
Replicou a autora AA - Companhia de Seguros, S.A., pugnando pela improcedência das alegadas excepções de prescrição e violação da limitação legal da obrigação indemnizatória da ré, alegando, sucintamente, que o prazo prescricional é de 20 anos em virtude de uma sentença condenatória ter reconhecido tal direito à autora, e mesmo se, assim, não se entendesse, então, só as prestações pagas a mais de 3 anos em relação à citação da ré estariam prescritas, e quanto ao limite legal do capital seguro obrigatório automóvel, deflui do contrato de seguro automóvel que o proprietário do veículo seguro e a ré asseguraram pelo montante máximo de €1.250.000,00 os danos emergentes dos riscos de circulação do dito veículo automóvel, e só, assim, se compreendendo, que a ré, à ordem de outro processo, transigiu pelo montante de € 500.000,00 com outro(s) lesado(s) numa altura em que já havia sido condenada a pagar outros valores que implicavam, então, que excedesse o tal limite legal, afigurando-se, assim, de ambíguo, o entendimento sustentado pela ré.
Alega ainda o pagamento que a ré fez à autora em 29-09-2009 do montante fixado na acção nº 576/2002 implica o reconhecimento da sua obrigação e, por isso, faz a prescrição não proceder.
Depois de cumprido o contraditório, ao abrigo do art. 3º nº3 do C.P.C., no que tange à questão da violação do caso julgado material decorrente do segmento do petitório formulado nos presentes autos em que a autora peticiona a condenação da ré no pagamento da reserva matemática constituída pelas pensões futuras no montante de € 54.190,48, por se antever que tal questão poderia ter ficado dirimida na decisão proferida no âmbito da acção ordinária Nº 576/2002 do 2º Juízo do Extinto Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a-Velha, foi proferido despacho saneador, no qual se procedeu à apreciação oficiosa da excepção dilatória de caso julgado material quanto ao segmento do pedido condenatório formulado nos autos de pagamento da quantia de € 54.190,48 referente a reserva matemática constituída pelas pensões futuras e respectivos juros de mora, seleccionando-se, ainda, no mesmo a matéria de facto assente e controvertida, a qual se fixou após reclamação apresentada pela ré que foi deferida.
Após se proceder à realização das diligências instrutórias, procedeu-se à realização de audiência final, com observância das formalidades legais, em sede da qual, a autora ampliou o pedido reportado às pensões pagas até Abril de 2013, para o valor global de € 30.820,44, ampliação essa que foi admitida, tendo as partes admitido, por acordo, o único facto controvertido reportado ao pagamento de tal montante global e a esse título e prescindido das alegações finais.
Proferida sentença, veio esta a decidir-se pela condenação da ré no pagamento à autora da quantia de € 30.820,44, acrescida de juros moratórios, à taxa em vigor de 4% a contar da citação até integral e efectivo pagamento.
Inconformada com tal decisão dela interpôs a ré recurso de apelação que a Relação de Coimbra julgou procedente, absolvendo a ré da condenação constante da sentença de 1ª instância, por procedência da excepção peremptória de prescrição do direito em causa.
Desta vez foi a autora que interpôs a presente revista tendo nas suas alegações formulado conclusões que por falta de concisão não serão aqui transcritas e das quais se deduz que a mesma para conhecer neste recurso levanta as seguintes questões:
a) O direito aqui ajuízado, estando sujeito ao prazo prescricional de três anos previsto no art. 498º, nº 2 do Cód. Civil, não se encontra prescrito, porque aquele prazo se encontrava interrompido até 7-04-2011, nos termos dos arts. 323º e 327º, nº 1 do referido código ?
b) E ainda porque na pendência da acção nº 576/2002, cuja decisão final apenas transitou em julgado em 7-04-2011, a recorrente estava impedida de reclamar judicialmente as prestações aqui em causa ?
A recorrida contra-alegou defendendo a improcedência do recurso e, para o caso de aquele ser julgado procedente, que seja conhecida a excepção peremptória de limitação da obrigação ressarcitória.
Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.
Como é sabido - arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Novo Cód. de Proc. Civil, a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem -, o âmbito dos recursos é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.
Já vimos as concretas questões levantadas pela recorrente como objecto deste recurso.
Mas antes de mais há que especificar a matéria de facto que as instâncias deram por provada que é a seguinte:
1-Sob o nº 996/03.0TBALB, correram autos de acção ordinária nos quais, após apensação à acção ordinária nº 576/2002, no extinto Tribunal Judicial de Albergaria-a-Velha, foi proferida douta Sentença Judicial constante de fls. 477 e ss., já transitada em julgado, por mor do qual se julgou procedente, por provado o pedido formulado pela então interveniente DD, Companhia de Seguros, S.A., que reclamou aí o reembolso dos montantes despendidos e que viesse a despender em regularização do sinistro estradal em discussão naqueles autos, na sua vertente de acidente de Trabalho, e consequentemente, condenou a ora Ré a pagar à, ora, Autora a quantia global de €. 35.560,77.
2-A sentença aludida em a), obteve confirmação, por Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Coimbra e do Supremo Tribunal de Justiça constantes de fls. 410 a 476 e de fls. 376 a 409, respectivamente.
3-Nos autos aludidos em 1), foram julgados provados os factos seguintes, com relevância para a presente instância:
“ /…/
a) MM, pai dos autores CC e DD, faleceu no dia 10.11.1999 no estado de casado com a autora FF;
/…/
c) Entre a empresa Transportes GG Lda. e a Interveniente DD, S.A., foi celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice nº 29120838, na modalidade de folha de férias
d) Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 1607571, em 10.11.1999 encontrava-se transferida para a Interveniente/Ré BB, S.A., a responsabilidade pelos danos causados com a circulação do veículo e reboque de matrículas...-HR e L-...;
/…/
f) O referido veículo pesado de mercadorias de matrícula ...-HR tinha acoplado o reboque com a matrícula L-... e era propriedade de Transportes HH, Lda., e no dia 10.10.1999 era conduzido pelo funcionário desta empresa, II;
/…/
i) No dia 10.11.1999, pelas 18.00 horas, a interveniente/ré JJ conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ...-LM, na A1, no sentido norte-sul, pela via de trânsito da esquerda;
j) A faixa de rodagem no local e no sentido em que circulava o LM tem uma largura de 7,40 e a berma 2,50 metros;
l) Na altura o piso estava bom e fazia bom tempo;
m) Era já ao escurecer e a Interveniente/Ré JJ podia avistar, com as luzes do veículo, a faixa de rodagem em toda a sua largura;
n) Ao chegar ao Km 245,760 daquela estrada e ao entrar numa curva à esquerda, com boa visibilidade, o LM embateu numa tela pneumática que se encontrava na mesma via;
o) Em consequência desse embate, a interveniente/ré JJ não conseguiu controlar o LM na fila de trânsito por onde seguia, que, desgovernado, invadiu a fila de trânsito à sua direita, aproximou-se da berma direita e invadiu essa mesma berma;
p) E foi embater com o LM em CC e LL, que na altura se encontravam na berma, onde se encontrava também, além de outros, o veículo ligeiro de matrícula ...-LB;
q) Em consequência do referido embate, CC e LL foram projectados para o talude que rodeia a berma da estrada;
r ) Em consequência do descrito em p) e q) , CC sofreu lesões toraxico-abdominais, nomeadamente a nível cardio-pulmonar e víscero abdominal, as quais vieram a constituir causa directa e necessária da sua morte;
s) CC conduzia o veículo pesado com a matrícula ...-OB, propriedade da sua entidade patronal, quando foi embatido pela tela de um pneumático de outro veículo pesado que seguia á sua frente;
t) Por tal facto, o CC parou o OB na berma da estrada e saiu do veículo.
u) As despesas do funeral de CC importaram na quantia de €. 1.352,30;
v) À data do sinistro, CC exercia a actividade de motorista de pesados aos serviço de Transportes GG, Lda., auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 561,23, acrescido de ajudas de custo no montante médio mensal de € 408,76;
/…/
e-1) Por morte do marido, a autora FF passou a receber da interveniente DD, S.A., uma pensão anual no montante de € 2.240,64 e a pensão anual e temporária de cada filho menor no montante de € 1.493,76;
/…/
i-1) No momento descrito em n) , em função da localização daquela tela na via e condições de circulação, a interveniente/ré JJ não tinha possibilidades de evitar o embate na referida tela pneumática;
j-1) A presença da referida tela pneumática na via apenas era perceptível para nos automobilistas quando já estavam muito próximos dela;
l-1) A tela supra referida fora deixada cair na faixa de rodagem pelo veículo pesado de mercador ias de matrícula ...-HR / L-..., fruto de descolagem do resto do pneu;
m-1) Essa tela havia caído na via pouco tempo antes do referido embate na mesma pelo LM;
n-1) O HR era conduzido por II ao serviço da sua proprietária, Transportes HH, Lda., e com o conhecimento e autorização desta;
o-1) Após a queda da tela pneumática, o II veio a parar o HR a cerca de 2,5 quilómetros mais à frente para troca do pneumático de onde a tela se havia descolado;
p-1) O falecido CC era, à data do sinistro, trabalhador de Transportes GG, Lda., na qualidade de motorista;
q-1) Em cumprimento do contrato aludido em c), e até 31.12.2003, a interveniente DD, S.A., pagou aos autores FF e filhos prestações a título de pensão anual temporária, num total de €. 10.881,15 à autora FF e num total de €. 7.358,23 a cada um dos filhos de CC;
r -1) Em reembolsos de despesas de funeral, transladação e despesas judiciais e de regularização de sinistro a interveniente DD, S.A. , despendeu €.1.434,71;
/…/
e-2) Após a data em que a interveniente DD, S.A., formulou pedido de reembolso nos presentes autos, pagou aos autores FF e filhos, além daquele valor e até 21.02.2006, a importância global de €. 8.528,45, a título de pensões laborais;
/…/ ”
4-Em cumprimento da Decisão proferida em 1), a Ré procedeu, em 15.11.2011, ao pagamento à autora da importância de € 37.637,91, reportando-se €. 35.560,77 ao capital decidido naquela Sentença judicial, e € 2.077,14 a juros de mora.
5-No âmbito dos autos n.º 576/2002 aludidos em a) dos Factos Assentes, a ora Ré foi, ainda, condenada a pagar:
i) À Autora LL (no Processo n.º 996/03.0TBALB, entretanto apenso ao Processo n.º 576/2002) o montante global líquido de €104.779,12, e ainda aquele que se liquidar em execução de sentença, relativo às despesas efectuadas com deslocações, refeições e tratamentos de fisioterapia e ao valor do computador portátil da Autora, acrescidos de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento; e
ii) À Autora LL e ao Interveniente MM a quantia líquida de € 450,00 e ainda aquela que se liquidar em execução de sentença, relativa ao prejuízo no veículo de matrícula ...-LB, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento.
6-No processo que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a- Velha (e, depois, no Juízo de Grande Instância Cível de Anadia, na Comarca do Baixo Vouga) sob o n.º 1152/05.9TBALB, a ora Ré foi demandada por JJ (condutora do veículo de matrícula ...-LM, que provocou as referidas lesões nas pessoas de CC e LL), a qual peticionou o ressarcimento de todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, por si sofridos no âmbito do mesmo acidente de viação.
7- Conforme decorre do teor da certidão junta a fls. 219 a 222, nos autos aludidos em f) dos Factos Assentes, Autora e aqui Ré transigiram nos seguintes termos:
-A Autora reduz o pedido à quantia de €500.000,00 (quinhentos mil euros);
- A Ré compromete-se a proceder ao pagamento da referida quantia, no prazo de trinta dias, por cheque a enviar, contra recibo, ao Ilustre Mandatário da Autora;
- Com o recebimento das aludidas verbas, a Autora declara-se integralmente ressarcida de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuros, emergentes do acidente em discussão nos autos, incluindo, designadamente, os danos relegados para liquidação posterior, respeitantes à necessidade de sujeição da Autora a uma ou mais intervenções cirúrgicas, a tratamentos médico-estéticos e a assistência médica, medicamentosa, psiquiátrica e de fisioterapia, nada mais tendo a reclamar da Ré, seja a que título for;
- As custas ainda em dívida a juízo serão pagas por Autora e Ré, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário que a Autora beneficia, prescindindo ambas de custas de parte e procuradoria na parte disponível.”..
8-…A qual foi homologada, por sentença datada de 7/06/2011, já transitada em julgado.
9- À data do acidente em discussão, o capital seguro por riscos de circulação do veículo pesado de mercadorias e reboque, com matrículas ...- HR e L-...; através da apólice nº1607571, era de esc. 250.000.000$00 (€1.246.994,74).
10- Desde 21.06.2006 até 03/04/2013, a Autora tem continuado a pagar as pensões à viúva e filhos do falecido CC, no montante global de 30.820,44 €, em regularização do sinistro.
Vejamos agora cada uma das concretas questões acima levantadas como objecto deste recurso.
a) Nesta primeira questão, a recorrente defende a não verificação do prazo de prescrição do direito por si peticionado e na parte reconhecida na sentença final da 1ª instância – dado que o restante peticionado se encontra julgado improcedente pela mesma sentença com trânsito em julgado, por falta de competente recurso que o abrangesse.
Como argumento a recorrente aponta aqui a circunstância de tendo o pedido aqui em causa sido formulado inicialmente na acção nº 576/2002 e nesta ter sido julgado improcedente, a decisão final desta acção apenas haver transitado em julgado em 7-04-2011, estando, pois, até essa altura interrompido o prazo de prescrição.
Vejamos.
Está a qui em causa um pedido de pagamento à autora de prestações a título de pensão de sobrevivência pagas pela recorrente à viúva e a dois filhos de uma vítima mortal de acidente de viação de que a ré foi responsável como seguradora do veículo que, pelo seu risco, é responsável pelos respectivos danos, entre os quais os decorrentes da morte do marido e pai dos referidos credores da pensão.
A autora fez esses pagamentos em virtude de ser seguradora num contrato de seguro de trabalho, dado que o acidente de viação foi igualmente de trabalho.
É, assim, com fundamento no disposto da Base XXXVII da Lei nº 2127, de 3 de Agosto – em vigor na data do acidente - que a autora peticiona o direito aqui em causa.
As partes e as instâncias estão em sintonia no sentido de que esse direito existe – salvo a recorrida que entende, porém, que esse direito não pode ser reclamado da mesma por haver excesso do limite do seguro viário que justifica a sua responsabilidade, além de alegar que a prescrição decretada no acórdão recorrido se verifica.
Também está aqui assente que esse direito tem a natureza de um direito de sub-rogação legal, previsto nos arts. 589º e segs. do Cód. Civil – e não de um direito de regresso, como o legislador daquela lei refere numa terminologia menos feliz.
A primeira parte da questão consiste em determinar o prazo de prescrição aqui aplicável.
O acórdão recorrido, tal como o fizera a sentença de 1ª instância, entendeu que esse prazo é o previsto no nº 2 do art. 498º do Cód. Civil, ou seja de três anos contados do cumprimento.
Aqui apenas a recorrida entende dever ser aplicado o prazo de um ano previsto na Base XXXVIII, nº 3 da referida Lei.
Não temos dúvidas de que o prazo é o de três anos referido, tal como douta e extensamente defenderam as instâncias e como tal conclusão não é aqui contestada pela recorrente, damos por aceite essa conclusão por a consideramos acertada.
A recorrida na sua contestação excepcionou a prescrição do direito e pretende a recorrente que esse prazo de prescrição se encontrava interrompido com a pendência da acção nº 576/202 referida onde aquela havia peticionado este mesmo direito e que a decisão final desta acção apenas transitou em 4-07-2011, tudo nos termos do art. 327º, nº 1 do Cód. Civil.
Tudo isto poderia proceder, eventualmente, se a recorrente houvesse na réplica deduzido a excepção à excepção de prescrição com a alegação da referida interrupção do prazo daquela prescrição.
Mas a recorrente não o fez neste sentido.
Com efeito, alegada a prescrição pela ré na sua contestação, tinha a autora de na réplica de alegar factos de que resultasse a excepção à excepção consistente na interrupção do decurso do prazo daquela – cfr. arts. 342º do Cód. Civil e 489º, 490º e 505º do Cód de Proc. Civil, na redacção anterior à Lei nº 41/2013 de 26/06, em vigor na data do decurso da fase dos articulados da presente acção.
E da réplica da recorrente de fls, 210 e segs. e sobre a excepção alegada pela ré de prescrição do direito, a recorrente apenas alegou a interrupção do prazo de prescrição decorrente do reconhecimento do direito peticionado pela recorrida através do pagamento da parte do pedido referente às prestações pagas até 2006 – únicas reconhecidas na referida acção -, pagamento esse que localizou temporalmente em 15-11-2011.
Logo a agora alegada interrupção do decurso do prazo de prescrição consistente na pendência da anterior acção onde o aqui peticionado havia já sido igualmente peticionada, embora sem êxito, não foi alegado tempestivamente, como devia nos termos das normas legais apontadas.
A alegação agora desta causa de interrupção da prescrição é extemporânea e, por isso, não pode ser considerada.
É que a recorrente, repete-se, tinha de alegar tempestivamente a referida excepção – interrupção do decurso do prazo de prescrição derivado da pendência de acção onde o mesmo direito havia sido peticionado formulado - à excepção – de prescrição - na réplica, nomeadamente para a ré poder impugnar a pendência dessa acção ou da identidade dos pedidos.
A referida acção nº 576/2002 esteve pendente até 7-04-2011 conforme certidão de fls. 225 e segs.
Porém, a parte aqui em causa, ficou decidida com trânsito em julgado com o acórdão da Relação de Coimbra de 4-11-2008 que confirmou a improcedência parcial do pedido da aqui recorrente de pagamento das prestações então futuras das pensões de sobrevivência, dada que a recorrente não interpôs recurso desse acórdão, pelo que o mesmo, nessa parte, transitou em julgado, dado que o recurso para o Supremo que lhe foi interposto não abrangeu a parte do decaímento da recorrente que ali não interpôs revista.
E de qualquer maneira, a recorrida teria de alegar e provar que essa interrupção havia terminado após o acórdão da Relação, mas para isso, teria a recorrente de haver alegado essa excepção à excepção de prescrição na réplica.
Desta forma, tem de improceder este fundamento do recurso, sem embargo de poder proceder a pretensão: revogação da decisão que declarou a prescrição, por outros fundamentos que iremos apreciar após a análise do segundo argumento da recorrente.
Por isso, passaremos para a apreciação da outra questão aqui levantada que, se improceder, levará à apreciação da manutenção da prescrição decretada, por outros argumentos não alegados, mas decorrentes da lei.
b) Nesta segunda questão, a recorrente defende que a pendência da referida acção nº 576/2002 impedia a recorrente de propor a presente acção, sob pena de litispendência.
Ora também este argumento tem de improceder pela razão apontada na decisão da questão anterior.
Com efeito, a pendência daquela acção em que a aqui autora havia formulado o mesmo pedido, então como direito futuro - e aqui como direito actual -, integrava-se numa interrupção do decurso do prazo da prescrição ou como impossibilidade de decurso do referido prazo, nos termos do art. 306º, nº 1 do Cód. Civil e como excepção à excepção tinha de ser alegada na réplica, o que a recorrente não fez, como resulta do já exposto.
Esta alegação agora é extemporânea em face do disposto nos arts. 505º com referência ao disposto nos arts. 489º e 490º do revogado Cód. de Proc. Civil, agora revogado e então em vigor.
Mas a falência deste argumento da recorrente não impede de julgar a pretensão base deduzida pela recorrente de não haver decorrido o prazo de prescrição, por outros fundamentos decorrentes da aplicação da lei.
Com efeito, a 1ª instância julgou o pedido procedente e a prescrição improcedente por estando aqui em causa prestações periódicas ou em renda, o prazo de três anos de prescrição apenas se contar desde o pagamento da última parcela e, por isso, o referido prazo de prescrição não decorrera.
Diversamente, o acórdão recorrido fazendo apelo ao disposto no art. 307º do Cód. Civil, entendeu que o referido prazo de prescrição se conta desde o pagamento da primeira parcela.
Pensamos que nenhuma das opiniões é a correcta.
Com efeito, estando aqui em causa o reembolso do pagamento de prestações mensais referentes a pensões de sobrevivência efectuado pela autora-recorrente, o prazo de prescrição não pode iniciar-se antes do efectivo pagamento pela autora, tal como este Supremo Tribunal uniformizou a jurisprudência através do assento nº 2/87 de 9-11-1977, publicado no Boletim do M. da Justiça, nº 271 a pág. 100 e segs. prescrevendo: “A sub –rogação não se verifica em relação a prestações futuras”.
Logo, nunca poderia entender-se que o prazo de prescrição pudesse correr do primeiro pagamento de uma prestação sob pena de se violar o disposto no art. 306º, nº 1 do Cód. Civil que diz que o prazo de prescrição não começa a correr antes de o direito em causa poder ser exercido.
O disposto no art. 307º do Cód. Civil tem de ser interpretado de forma mais cuidadosa e articulada com o referido disposto no art. 306º, nº 1 mencionado.
O art. 307º referido prescreve que estando em causa renda perpétua ou vitalícia ou outras prestações periódicas análogas, a prescrição do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que for paga.
No caso em apreço pode-se descortinar duas espécies de direitos.
O primeiro consiste no direito à pensão de sobrevivência como direito unitário a receber as pensões vitalícias ou periódicas – aqui na modalidade de a autora ter direito unitário ao reembolso dos pagamentos que efectuar em cumprimento desse direito.
A segunda espécie de direito consiste nos direitos que do primeiro periodicamente se desprendem, correspondentes às prestações periódicas em que a pensão se concretiza ao longo do tempo.
Ao primeiro se aplica o disposto no art. 307º referido quanto ao início da contagem do prazo de prescrição.
Ao segundo aplica-se o disposto nos arts. 306º, nº 1 e 498º, nº 2 do Cód. Civil pelo que o prazo de prescrição se conta do efectivo pagamento por parte da autora de cada prestação efectuada.
O direito unitário, que não está qui em causa, tem aqui, como salienta a recorrente, o prazo de prescrição geral de vinte anos previsto no art. 309º do Cód. Civil, atento a circunstância de que na referida acção esse direito unitário haver sido reconhecido por sentença, na medida em que o mesmo é o pressuposto lógico da condenação ali efectuada de reembolso da autora das prestações efectivamente já prestadas e ali reconhecidas, tal como resulta do disposto no art. 311º, nº 1 do Cód. Civil.
Isto quer dizer que o direito unitário, ou seja o direito à pensão de sobrevivência referida prescreve desde que decorra o prazo legal de prescrição contado desde o vencimento da primeira prestação referente à mesma pensão ou direito unitário, tal como resulta do art. 307º mencionado.
Mas aqui esse direito unitário, como já dissemos, foi reconhecido na sentença da referida acção e foi, ainda, ali a recorrida condenada a pagar à autora os direitos periódicos resultantes daquele direito unitário que a recorrente havia já despendido efectivamente pagando aos referidos herdeiros da vítima, prestações essas pagas pela recorrente até 2006.
Não está qui em causa o direito unitário à pensão de sobrevivência, previsto no art. 307º referido, mas o direito às sucessivas, concretas e derivadas prestações que vêm sendo pagas a esse título, depois desse direito haver ficado reconhecido na acção nº 576/2002 referida.
As que se venceram após 2006 e foram pagas pela autora posteriormente, tinham o prazo de três anos contados do efectivo pagamento de cada uma delas para serem reclamadas pela autora, sob pena de prescrição – arts. 306º, nº 1 e 498º, nº 2 do Cód. Civil.
Assim, estão prescritas as prestações que a recorrente pagou anteriormente ao período de três anos que antecederam a data de 18-07-2012 – cinco dias após a apresentação da petição inicial desta acção, data em que se interrompera a prescrição, nos termos do art. 323º, nº 2 do Cód. Civil.
Já as prestações que a recorrente pagou dentro do referido prazo de três anos que antecedeu o dia 18-07-2012 e as que pagou na pendência da acção e foram incluídas na ampliação do pedido, não estão prescritas porque o prazo de prescrição foi interrompido pela propositura da presente acção.
Procede parcialmente e de forma diversa dos fundamentos da recorrente o presente recurso.
Porém, na apelação a aqui recorrida e ré, além de haver levantado a questão da prescrição de todo o pedido concedido na 1ª instância, também pediu, para o caso de aquela questão não proceder, a sua absolvição de todo o pedido por este estar para além do limite do contrato de seguro pelo qual foi condenada.
Esta segunda causa de impugnação da condenação da ré-apelante não foi objecto de decisão no acórdão recorrido por haver ficado prejudicado com a declaração de prescrição.
Por isso, terá a Relação de prosseguir com a apreciação da apelação, conhecendo dessa segunda questão que havia ficado prejudicada pela decisão de prescrição, decisão essa que é aqui parcialmente revogada.
Este conhecimento deverá ser efectuado, se possível, pelos mesmos juízes, nos termos dos arts. 665º, nº 2 , 679º a contrario e 683º, nº 1, aplicado este último analogicamente.
É que o regime de substituição previsto para a Relação no nº 2 do art. 715º do revogado Código de Processo Civil que era aplicável ao Supremo Tribunal de Justiça – segundo jurisprudência não uniforme -, por força do disposto no art. 726º do mesmo revogado diploma legal, foi alterado, não se aplicando agora esse regime de substituição ao Supremo Tribunal – cfr. art. 679º.
Pelo exposto e por fundamentos diversos, concede-se parcialmente a presente revista e se revoga o acórdão recorrido na parte em que considerou prescritas as prestações aqui peticionadas pagas pela recorrente aos familiares da vítima do acidente em causa, dentro do período de tempo de três anos contado imediatamente antes de 18-07-2012 e as que foram pagas depois desse período e abrangidas pela ampliação do pedido efectuada a fls. 598 dos autos, mantendo-se a decisão de prescrição decretada no acórdão recorrido no que toca às prestações pagas pela recorrente antes do período de tempo de três anos mencionado.
Como a autora não discriminou o tempo exacto em que pagou cada uma das prestações, haverá, nos termos do disposto nos art. 609º, nº 2 e 358º, n 2 de ser efectuada a liquidação do montante do pedido que efectivamente não está abrangido pela prescrição, no caso de a Relação não dar acolhimento à outra causa de impugnação da apelante.
Os autos voltarão para a Relação a fim de pelos mesmos juízes, se possível, seja conhecido da questão levantada pela apelante sobre a excepção peremptória consistente na limitação da obrigação ressarcitória da apelante.
Custas da revista pela recorrente e recorrida em partes iguais.
As custas da apelação e da 1ª instância deverão ser atribuídas pela Relação de acordo com o que vier a ser decidido na futura decisão da apelação.
2014-05-13
João Camilo ( Relator )
Fonseca Ramos
Fernandes do Vale.
II. Pretendendo uma seguradora num contrato de trabalho o reembolso das prestações mensais que vem pagando a título de pensão de sobrevivência à viúva e filhos menores da vítima mortal em acidente de trabalho que é igualmente de viação e pretendendo o reembolso da seguradora do veículo considerado responsável pelos respectivos danos, tem o prazo de prescrição desse direito de reembolso de três anos contados da data de pagamento de cada uma das prestações efectivamente pagas e não contado da data do pagamento da primeira prestação peticionada.
* Nos termos do art. 663º, nº 7, CPC
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
AA, Companhia de Seguros, S.A. veio propor a presente acção sob a forma de processo ordinário contra a Companhia de Seguros BB, S.A., pedindo, entre o mais, o seguinte:
i) A condenação da ré no pagamento à autora da quantia global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido CC, e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento; e
ii) Subsidiariamente, e para a eventualidade de assim se não entender, ser a ré condenada a pagar à autora a importância global de € 105.060,19, reportando-se € 25.860,61 a juros de mora vencidos sobre o capital de € 35.560,77 desde 25.09.2003 a 15.11.2011, € 25.009,10 a pensões pagas pela Autora desde 21/06/2006 a 30/06/2012 à viúva e filhos do falecido CC, e € 54.190,48 a reserva matemática constituída pelas pensões futuras, e ainda juros de mora à taxa legal sucessivamente aplicável para as transacções comerciais, contabilizados sobre o valor de capital de € 79.199,58, desde a citação para a presente acção até integral e efectivo pagamento, a título de restituição por enriquecimento sem causa justificativa.
Alegou, para tanto, que sob o nº 996/03.0TBALB correram os autos de processo ordinário, nos quais foi proferida sentença a condenar a ré no pagamento à autora da quantia global de € 35.560,77, já transitada em julgado, após confirmação por Acórdãos da Relação de Coimbra e Supremo Tribunal de Justiça juntos aos autos, correspondente ao reembolso de montantes parcelares pagos pela ora autora aos herdeiros da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, até 21/06/2006, no qual se considerou a ré obrigada a proceder ao seu pagamento em virtude de se decidir aí que o acidente de viação e simultaneamente acidente de trabalho, que vitimou a infeliz vítima CC foi causado pelos riscos de circulação do veículo «OB» (ou seja, responsabilidade pelo risco), cujo proprietário havia transferido a responsabilidade civil pela indemnização por danos causados pela circulação do veículo para a ora ré através da apólice nº 1607571; também se decidiu aí que a obrigação do responsável não abrangia as pensões futuras, ou sequer as reservas matemáticas; em cumprimento do ai decidido, a ré procedeu, em 15/11/2011, ao pagamento à autora da quantia de capital de €35.560, 77 acrescido da quantia de € 2.077,14 a título de juros moratórios legais; posteriormente, e reportado ao período compreendido entre 21/06/2006 e até 30/06/2012, a autora despendeu mais €25.009,10 com as pensões devidas à viúva e filhos da infeliz vitima, em sede de acidente de trabalho, e por causa da regularização do sinistro estradal, e simultaneamente, acidente de trabalho, assistindo-lhe, assim, o direito de ser reembolsada de tais quantias nos mesmos termos do decidido anteriormente nos autos atrás mencionados.
Regularmente citada, a ré Companhia de Seguros BB, S.A. deduziu contestação, na qual se defendendo-se por excepção e por impugnação.
Por impugnação, defende-se por negação directa quanto aos montantes parcelares pagos pela autora aos herdeiros da infeliz vitima.
Por excepção, invocou a prescrição extintiva da obrigação de reembolso das quantias parcelares pagas, por um lado, e que o valor reclamado pela autora, no caso de não se verificar a prescrição extintiva, excede, tendo em conta os montantes já pagos à autora e outros lesados, em consequência do sinistro, em discussão, o limite legal do capital seguro obrigatório automóvel de €600.000,00, em vigor à data do acidente, por outro lado.
Replicou a autora AA - Companhia de Seguros, S.A., pugnando pela improcedência das alegadas excepções de prescrição e violação da limitação legal da obrigação indemnizatória da ré, alegando, sucintamente, que o prazo prescricional é de 20 anos em virtude de uma sentença condenatória ter reconhecido tal direito à autora, e mesmo se, assim, não se entendesse, então, só as prestações pagas a mais de 3 anos em relação à citação da ré estariam prescritas, e quanto ao limite legal do capital seguro obrigatório automóvel, deflui do contrato de seguro automóvel que o proprietário do veículo seguro e a ré asseguraram pelo montante máximo de €1.250.000,00 os danos emergentes dos riscos de circulação do dito veículo automóvel, e só, assim, se compreendendo, que a ré, à ordem de outro processo, transigiu pelo montante de € 500.000,00 com outro(s) lesado(s) numa altura em que já havia sido condenada a pagar outros valores que implicavam, então, que excedesse o tal limite legal, afigurando-se, assim, de ambíguo, o entendimento sustentado pela ré.
Alega ainda o pagamento que a ré fez à autora em 29-09-2009 do montante fixado na acção nº 576/2002 implica o reconhecimento da sua obrigação e, por isso, faz a prescrição não proceder.
Depois de cumprido o contraditório, ao abrigo do art. 3º nº3 do C.P.C., no que tange à questão da violação do caso julgado material decorrente do segmento do petitório formulado nos presentes autos em que a autora peticiona a condenação da ré no pagamento da reserva matemática constituída pelas pensões futuras no montante de € 54.190,48, por se antever que tal questão poderia ter ficado dirimida na decisão proferida no âmbito da acção ordinária Nº 576/2002 do 2º Juízo do Extinto Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a-Velha, foi proferido despacho saneador, no qual se procedeu à apreciação oficiosa da excepção dilatória de caso julgado material quanto ao segmento do pedido condenatório formulado nos autos de pagamento da quantia de € 54.190,48 referente a reserva matemática constituída pelas pensões futuras e respectivos juros de mora, seleccionando-se, ainda, no mesmo a matéria de facto assente e controvertida, a qual se fixou após reclamação apresentada pela ré que foi deferida.
Após se proceder à realização das diligências instrutórias, procedeu-se à realização de audiência final, com observância das formalidades legais, em sede da qual, a autora ampliou o pedido reportado às pensões pagas até Abril de 2013, para o valor global de € 30.820,44, ampliação essa que foi admitida, tendo as partes admitido, por acordo, o único facto controvertido reportado ao pagamento de tal montante global e a esse título e prescindido das alegações finais.
Proferida sentença, veio esta a decidir-se pela condenação da ré no pagamento à autora da quantia de € 30.820,44, acrescida de juros moratórios, à taxa em vigor de 4% a contar da citação até integral e efectivo pagamento.
Inconformada com tal decisão dela interpôs a ré recurso de apelação que a Relação de Coimbra julgou procedente, absolvendo a ré da condenação constante da sentença de 1ª instância, por procedência da excepção peremptória de prescrição do direito em causa.
Desta vez foi a autora que interpôs a presente revista tendo nas suas alegações formulado conclusões que por falta de concisão não serão aqui transcritas e das quais se deduz que a mesma para conhecer neste recurso levanta as seguintes questões:
a) O direito aqui ajuízado, estando sujeito ao prazo prescricional de três anos previsto no art. 498º, nº 2 do Cód. Civil, não se encontra prescrito, porque aquele prazo se encontrava interrompido até 7-04-2011, nos termos dos arts. 323º e 327º, nº 1 do referido código ?
b) E ainda porque na pendência da acção nº 576/2002, cuja decisão final apenas transitou em julgado em 7-04-2011, a recorrente estava impedida de reclamar judicialmente as prestações aqui em causa ?
A recorrida contra-alegou defendendo a improcedência do recurso e, para o caso de aquele ser julgado procedente, que seja conhecida a excepção peremptória de limitação da obrigação ressarcitória.
Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.
Como é sabido - arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Novo Cód. de Proc. Civil, a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem -, o âmbito dos recursos é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.
Já vimos as concretas questões levantadas pela recorrente como objecto deste recurso.
Mas antes de mais há que especificar a matéria de facto que as instâncias deram por provada que é a seguinte:
1-Sob o nº 996/03.0TBALB, correram autos de acção ordinária nos quais, após apensação à acção ordinária nº 576/2002, no extinto Tribunal Judicial de Albergaria-a-Velha, foi proferida douta Sentença Judicial constante de fls. 477 e ss., já transitada em julgado, por mor do qual se julgou procedente, por provado o pedido formulado pela então interveniente DD, Companhia de Seguros, S.A., que reclamou aí o reembolso dos montantes despendidos e que viesse a despender em regularização do sinistro estradal em discussão naqueles autos, na sua vertente de acidente de Trabalho, e consequentemente, condenou a ora Ré a pagar à, ora, Autora a quantia global de €. 35.560,77.
2-A sentença aludida em a), obteve confirmação, por Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Coimbra e do Supremo Tribunal de Justiça constantes de fls. 410 a 476 e de fls. 376 a 409, respectivamente.
3-Nos autos aludidos em 1), foram julgados provados os factos seguintes, com relevância para a presente instância:
“ /…/
a) MM, pai dos autores CC e DD, faleceu no dia 10.11.1999 no estado de casado com a autora FF;
/…/
c) Entre a empresa Transportes GG Lda. e a Interveniente DD, S.A., foi celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice nº 29120838, na modalidade de folha de férias
d) Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 1607571, em 10.11.1999 encontrava-se transferida para a Interveniente/Ré BB, S.A., a responsabilidade pelos danos causados com a circulação do veículo e reboque de matrículas...-HR e L-...;
/…/
f) O referido veículo pesado de mercadorias de matrícula ...-HR tinha acoplado o reboque com a matrícula L-... e era propriedade de Transportes HH, Lda., e no dia 10.10.1999 era conduzido pelo funcionário desta empresa, II;
/…/
i) No dia 10.11.1999, pelas 18.00 horas, a interveniente/ré JJ conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ...-LM, na A1, no sentido norte-sul, pela via de trânsito da esquerda;
j) A faixa de rodagem no local e no sentido em que circulava o LM tem uma largura de 7,40 e a berma 2,50 metros;
l) Na altura o piso estava bom e fazia bom tempo;
m) Era já ao escurecer e a Interveniente/Ré JJ podia avistar, com as luzes do veículo, a faixa de rodagem em toda a sua largura;
n) Ao chegar ao Km 245,760 daquela estrada e ao entrar numa curva à esquerda, com boa visibilidade, o LM embateu numa tela pneumática que se encontrava na mesma via;
o) Em consequência desse embate, a interveniente/ré JJ não conseguiu controlar o LM na fila de trânsito por onde seguia, que, desgovernado, invadiu a fila de trânsito à sua direita, aproximou-se da berma direita e invadiu essa mesma berma;
p) E foi embater com o LM em CC e LL, que na altura se encontravam na berma, onde se encontrava também, além de outros, o veículo ligeiro de matrícula ...-LB;
q) Em consequência do referido embate, CC e LL foram projectados para o talude que rodeia a berma da estrada;
r ) Em consequência do descrito em p) e q) , CC sofreu lesões toraxico-abdominais, nomeadamente a nível cardio-pulmonar e víscero abdominal, as quais vieram a constituir causa directa e necessária da sua morte;
s) CC conduzia o veículo pesado com a matrícula ...-OB, propriedade da sua entidade patronal, quando foi embatido pela tela de um pneumático de outro veículo pesado que seguia á sua frente;
t) Por tal facto, o CC parou o OB na berma da estrada e saiu do veículo.
u) As despesas do funeral de CC importaram na quantia de €. 1.352,30;
v) À data do sinistro, CC exercia a actividade de motorista de pesados aos serviço de Transportes GG, Lda., auferindo o vencimento mensal ilíquido de € 561,23, acrescido de ajudas de custo no montante médio mensal de € 408,76;
/…/
e-1) Por morte do marido, a autora FF passou a receber da interveniente DD, S.A., uma pensão anual no montante de € 2.240,64 e a pensão anual e temporária de cada filho menor no montante de € 1.493,76;
/…/
i-1) No momento descrito em n) , em função da localização daquela tela na via e condições de circulação, a interveniente/ré JJ não tinha possibilidades de evitar o embate na referida tela pneumática;
j-1) A presença da referida tela pneumática na via apenas era perceptível para nos automobilistas quando já estavam muito próximos dela;
l-1) A tela supra referida fora deixada cair na faixa de rodagem pelo veículo pesado de mercador ias de matrícula ...-HR / L-..., fruto de descolagem do resto do pneu;
m-1) Essa tela havia caído na via pouco tempo antes do referido embate na mesma pelo LM;
n-1) O HR era conduzido por II ao serviço da sua proprietária, Transportes HH, Lda., e com o conhecimento e autorização desta;
o-1) Após a queda da tela pneumática, o II veio a parar o HR a cerca de 2,5 quilómetros mais à frente para troca do pneumático de onde a tela se havia descolado;
p-1) O falecido CC era, à data do sinistro, trabalhador de Transportes GG, Lda., na qualidade de motorista;
q-1) Em cumprimento do contrato aludido em c), e até 31.12.2003, a interveniente DD, S.A., pagou aos autores FF e filhos prestações a título de pensão anual temporária, num total de €. 10.881,15 à autora FF e num total de €. 7.358,23 a cada um dos filhos de CC;
r -1) Em reembolsos de despesas de funeral, transladação e despesas judiciais e de regularização de sinistro a interveniente DD, S.A. , despendeu €.1.434,71;
/…/
e-2) Após a data em que a interveniente DD, S.A., formulou pedido de reembolso nos presentes autos, pagou aos autores FF e filhos, além daquele valor e até 21.02.2006, a importância global de €. 8.528,45, a título de pensões laborais;
/…/ ”
4-Em cumprimento da Decisão proferida em 1), a Ré procedeu, em 15.11.2011, ao pagamento à autora da importância de € 37.637,91, reportando-se €. 35.560,77 ao capital decidido naquela Sentença judicial, e € 2.077,14 a juros de mora.
5-No âmbito dos autos n.º 576/2002 aludidos em a) dos Factos Assentes, a ora Ré foi, ainda, condenada a pagar:
i) À Autora LL (no Processo n.º 996/03.0TBALB, entretanto apenso ao Processo n.º 576/2002) o montante global líquido de €104.779,12, e ainda aquele que se liquidar em execução de sentença, relativo às despesas efectuadas com deslocações, refeições e tratamentos de fisioterapia e ao valor do computador portátil da Autora, acrescidos de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento; e
ii) À Autora LL e ao Interveniente MM a quantia líquida de € 450,00 e ainda aquela que se liquidar em execução de sentença, relativa ao prejuízo no veículo de matrícula ...-LB, acrescidas de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação até integral pagamento.
6-No processo que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Albergaria-a- Velha (e, depois, no Juízo de Grande Instância Cível de Anadia, na Comarca do Baixo Vouga) sob o n.º 1152/05.9TBALB, a ora Ré foi demandada por JJ (condutora do veículo de matrícula ...-LM, que provocou as referidas lesões nas pessoas de CC e LL), a qual peticionou o ressarcimento de todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, por si sofridos no âmbito do mesmo acidente de viação.
7- Conforme decorre do teor da certidão junta a fls. 219 a 222, nos autos aludidos em f) dos Factos Assentes, Autora e aqui Ré transigiram nos seguintes termos:
-A Autora reduz o pedido à quantia de €500.000,00 (quinhentos mil euros);
- A Ré compromete-se a proceder ao pagamento da referida quantia, no prazo de trinta dias, por cheque a enviar, contra recibo, ao Ilustre Mandatário da Autora;
- Com o recebimento das aludidas verbas, a Autora declara-se integralmente ressarcida de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuros, emergentes do acidente em discussão nos autos, incluindo, designadamente, os danos relegados para liquidação posterior, respeitantes à necessidade de sujeição da Autora a uma ou mais intervenções cirúrgicas, a tratamentos médico-estéticos e a assistência médica, medicamentosa, psiquiátrica e de fisioterapia, nada mais tendo a reclamar da Ré, seja a que título for;
- As custas ainda em dívida a juízo serão pagas por Autora e Ré, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário que a Autora beneficia, prescindindo ambas de custas de parte e procuradoria na parte disponível.”..
8-…A qual foi homologada, por sentença datada de 7/06/2011, já transitada em julgado.
9- À data do acidente em discussão, o capital seguro por riscos de circulação do veículo pesado de mercadorias e reboque, com matrículas ...- HR e L-...; através da apólice nº1607571, era de esc. 250.000.000$00 (€1.246.994,74).
10- Desde 21.06.2006 até 03/04/2013, a Autora tem continuado a pagar as pensões à viúva e filhos do falecido CC, no montante global de 30.820,44 €, em regularização do sinistro.
Vejamos agora cada uma das concretas questões acima levantadas como objecto deste recurso.
a) Nesta primeira questão, a recorrente defende a não verificação do prazo de prescrição do direito por si peticionado e na parte reconhecida na sentença final da 1ª instância – dado que o restante peticionado se encontra julgado improcedente pela mesma sentença com trânsito em julgado, por falta de competente recurso que o abrangesse.
Como argumento a recorrente aponta aqui a circunstância de tendo o pedido aqui em causa sido formulado inicialmente na acção nº 576/2002 e nesta ter sido julgado improcedente, a decisão final desta acção apenas haver transitado em julgado em 7-04-2011, estando, pois, até essa altura interrompido o prazo de prescrição.
Vejamos.
Está a qui em causa um pedido de pagamento à autora de prestações a título de pensão de sobrevivência pagas pela recorrente à viúva e a dois filhos de uma vítima mortal de acidente de viação de que a ré foi responsável como seguradora do veículo que, pelo seu risco, é responsável pelos respectivos danos, entre os quais os decorrentes da morte do marido e pai dos referidos credores da pensão.
A autora fez esses pagamentos em virtude de ser seguradora num contrato de seguro de trabalho, dado que o acidente de viação foi igualmente de trabalho.
É, assim, com fundamento no disposto da Base XXXVII da Lei nº 2127, de 3 de Agosto – em vigor na data do acidente - que a autora peticiona o direito aqui em causa.
As partes e as instâncias estão em sintonia no sentido de que esse direito existe – salvo a recorrida que entende, porém, que esse direito não pode ser reclamado da mesma por haver excesso do limite do seguro viário que justifica a sua responsabilidade, além de alegar que a prescrição decretada no acórdão recorrido se verifica.
Também está aqui assente que esse direito tem a natureza de um direito de sub-rogação legal, previsto nos arts. 589º e segs. do Cód. Civil – e não de um direito de regresso, como o legislador daquela lei refere numa terminologia menos feliz.
A primeira parte da questão consiste em determinar o prazo de prescrição aqui aplicável.
O acórdão recorrido, tal como o fizera a sentença de 1ª instância, entendeu que esse prazo é o previsto no nº 2 do art. 498º do Cód. Civil, ou seja de três anos contados do cumprimento.
Aqui apenas a recorrida entende dever ser aplicado o prazo de um ano previsto na Base XXXVIII, nº 3 da referida Lei.
Não temos dúvidas de que o prazo é o de três anos referido, tal como douta e extensamente defenderam as instâncias e como tal conclusão não é aqui contestada pela recorrente, damos por aceite essa conclusão por a consideramos acertada.
A recorrida na sua contestação excepcionou a prescrição do direito e pretende a recorrente que esse prazo de prescrição se encontrava interrompido com a pendência da acção nº 576/202 referida onde aquela havia peticionado este mesmo direito e que a decisão final desta acção apenas transitou em 4-07-2011, tudo nos termos do art. 327º, nº 1 do Cód. Civil.
Tudo isto poderia proceder, eventualmente, se a recorrente houvesse na réplica deduzido a excepção à excepção de prescrição com a alegação da referida interrupção do prazo daquela prescrição.
Mas a recorrente não o fez neste sentido.
Com efeito, alegada a prescrição pela ré na sua contestação, tinha a autora de na réplica de alegar factos de que resultasse a excepção à excepção consistente na interrupção do decurso do prazo daquela – cfr. arts. 342º do Cód. Civil e 489º, 490º e 505º do Cód de Proc. Civil, na redacção anterior à Lei nº 41/2013 de 26/06, em vigor na data do decurso da fase dos articulados da presente acção.
E da réplica da recorrente de fls, 210 e segs. e sobre a excepção alegada pela ré de prescrição do direito, a recorrente apenas alegou a interrupção do prazo de prescrição decorrente do reconhecimento do direito peticionado pela recorrida através do pagamento da parte do pedido referente às prestações pagas até 2006 – únicas reconhecidas na referida acção -, pagamento esse que localizou temporalmente em 15-11-2011.
Logo a agora alegada interrupção do decurso do prazo de prescrição consistente na pendência da anterior acção onde o aqui peticionado havia já sido igualmente peticionada, embora sem êxito, não foi alegado tempestivamente, como devia nos termos das normas legais apontadas.
A alegação agora desta causa de interrupção da prescrição é extemporânea e, por isso, não pode ser considerada.
É que a recorrente, repete-se, tinha de alegar tempestivamente a referida excepção – interrupção do decurso do prazo de prescrição derivado da pendência de acção onde o mesmo direito havia sido peticionado formulado - à excepção – de prescrição - na réplica, nomeadamente para a ré poder impugnar a pendência dessa acção ou da identidade dos pedidos.
A referida acção nº 576/2002 esteve pendente até 7-04-2011 conforme certidão de fls. 225 e segs.
Porém, a parte aqui em causa, ficou decidida com trânsito em julgado com o acórdão da Relação de Coimbra de 4-11-2008 que confirmou a improcedência parcial do pedido da aqui recorrente de pagamento das prestações então futuras das pensões de sobrevivência, dada que a recorrente não interpôs recurso desse acórdão, pelo que o mesmo, nessa parte, transitou em julgado, dado que o recurso para o Supremo que lhe foi interposto não abrangeu a parte do decaímento da recorrente que ali não interpôs revista.
E de qualquer maneira, a recorrida teria de alegar e provar que essa interrupção havia terminado após o acórdão da Relação, mas para isso, teria a recorrente de haver alegado essa excepção à excepção de prescrição na réplica.
Desta forma, tem de improceder este fundamento do recurso, sem embargo de poder proceder a pretensão: revogação da decisão que declarou a prescrição, por outros fundamentos que iremos apreciar após a análise do segundo argumento da recorrente.
Por isso, passaremos para a apreciação da outra questão aqui levantada que, se improceder, levará à apreciação da manutenção da prescrição decretada, por outros argumentos não alegados, mas decorrentes da lei.
b) Nesta segunda questão, a recorrente defende que a pendência da referida acção nº 576/2002 impedia a recorrente de propor a presente acção, sob pena de litispendência.
Ora também este argumento tem de improceder pela razão apontada na decisão da questão anterior.
Com efeito, a pendência daquela acção em que a aqui autora havia formulado o mesmo pedido, então como direito futuro - e aqui como direito actual -, integrava-se numa interrupção do decurso do prazo da prescrição ou como impossibilidade de decurso do referido prazo, nos termos do art. 306º, nº 1 do Cód. Civil e como excepção à excepção tinha de ser alegada na réplica, o que a recorrente não fez, como resulta do já exposto.
Esta alegação agora é extemporânea em face do disposto nos arts. 505º com referência ao disposto nos arts. 489º e 490º do revogado Cód. de Proc. Civil, agora revogado e então em vigor.
Mas a falência deste argumento da recorrente não impede de julgar a pretensão base deduzida pela recorrente de não haver decorrido o prazo de prescrição, por outros fundamentos decorrentes da aplicação da lei.
Com efeito, a 1ª instância julgou o pedido procedente e a prescrição improcedente por estando aqui em causa prestações periódicas ou em renda, o prazo de três anos de prescrição apenas se contar desde o pagamento da última parcela e, por isso, o referido prazo de prescrição não decorrera.
Diversamente, o acórdão recorrido fazendo apelo ao disposto no art. 307º do Cód. Civil, entendeu que o referido prazo de prescrição se conta desde o pagamento da primeira parcela.
Pensamos que nenhuma das opiniões é a correcta.
Com efeito, estando aqui em causa o reembolso do pagamento de prestações mensais referentes a pensões de sobrevivência efectuado pela autora-recorrente, o prazo de prescrição não pode iniciar-se antes do efectivo pagamento pela autora, tal como este Supremo Tribunal uniformizou a jurisprudência através do assento nº 2/87 de 9-11-1977, publicado no Boletim do M. da Justiça, nº 271 a pág. 100 e segs. prescrevendo: “A sub –rogação não se verifica em relação a prestações futuras”.
Logo, nunca poderia entender-se que o prazo de prescrição pudesse correr do primeiro pagamento de uma prestação sob pena de se violar o disposto no art. 306º, nº 1 do Cód. Civil que diz que o prazo de prescrição não começa a correr antes de o direito em causa poder ser exercido.
O disposto no art. 307º do Cód. Civil tem de ser interpretado de forma mais cuidadosa e articulada com o referido disposto no art. 306º, nº 1 mencionado.
O art. 307º referido prescreve que estando em causa renda perpétua ou vitalícia ou outras prestações periódicas análogas, a prescrição do direito unitário do credor corre desde a exigibilidade da primeira prestação que for paga.
No caso em apreço pode-se descortinar duas espécies de direitos.
O primeiro consiste no direito à pensão de sobrevivência como direito unitário a receber as pensões vitalícias ou periódicas – aqui na modalidade de a autora ter direito unitário ao reembolso dos pagamentos que efectuar em cumprimento desse direito.
A segunda espécie de direito consiste nos direitos que do primeiro periodicamente se desprendem, correspondentes às prestações periódicas em que a pensão se concretiza ao longo do tempo.
Ao primeiro se aplica o disposto no art. 307º referido quanto ao início da contagem do prazo de prescrição.
Ao segundo aplica-se o disposto nos arts. 306º, nº 1 e 498º, nº 2 do Cód. Civil pelo que o prazo de prescrição se conta do efectivo pagamento por parte da autora de cada prestação efectuada.
O direito unitário, que não está qui em causa, tem aqui, como salienta a recorrente, o prazo de prescrição geral de vinte anos previsto no art. 309º do Cód. Civil, atento a circunstância de que na referida acção esse direito unitário haver sido reconhecido por sentença, na medida em que o mesmo é o pressuposto lógico da condenação ali efectuada de reembolso da autora das prestações efectivamente já prestadas e ali reconhecidas, tal como resulta do disposto no art. 311º, nº 1 do Cód. Civil.
Isto quer dizer que o direito unitário, ou seja o direito à pensão de sobrevivência referida prescreve desde que decorra o prazo legal de prescrição contado desde o vencimento da primeira prestação referente à mesma pensão ou direito unitário, tal como resulta do art. 307º mencionado.
Mas aqui esse direito unitário, como já dissemos, foi reconhecido na sentença da referida acção e foi, ainda, ali a recorrida condenada a pagar à autora os direitos periódicos resultantes daquele direito unitário que a recorrente havia já despendido efectivamente pagando aos referidos herdeiros da vítima, prestações essas pagas pela recorrente até 2006.
Não está qui em causa o direito unitário à pensão de sobrevivência, previsto no art. 307º referido, mas o direito às sucessivas, concretas e derivadas prestações que vêm sendo pagas a esse título, depois desse direito haver ficado reconhecido na acção nº 576/2002 referida.
As que se venceram após 2006 e foram pagas pela autora posteriormente, tinham o prazo de três anos contados do efectivo pagamento de cada uma delas para serem reclamadas pela autora, sob pena de prescrição – arts. 306º, nº 1 e 498º, nº 2 do Cód. Civil.
Assim, estão prescritas as prestações que a recorrente pagou anteriormente ao período de três anos que antecederam a data de 18-07-2012 – cinco dias após a apresentação da petição inicial desta acção, data em que se interrompera a prescrição, nos termos do art. 323º, nº 2 do Cód. Civil.
Já as prestações que a recorrente pagou dentro do referido prazo de três anos que antecedeu o dia 18-07-2012 e as que pagou na pendência da acção e foram incluídas na ampliação do pedido, não estão prescritas porque o prazo de prescrição foi interrompido pela propositura da presente acção.
Procede parcialmente e de forma diversa dos fundamentos da recorrente o presente recurso.
Porém, na apelação a aqui recorrida e ré, além de haver levantado a questão da prescrição de todo o pedido concedido na 1ª instância, também pediu, para o caso de aquela questão não proceder, a sua absolvição de todo o pedido por este estar para além do limite do contrato de seguro pelo qual foi condenada.
Esta segunda causa de impugnação da condenação da ré-apelante não foi objecto de decisão no acórdão recorrido por haver ficado prejudicado com a declaração de prescrição.
Por isso, terá a Relação de prosseguir com a apreciação da apelação, conhecendo dessa segunda questão que havia ficado prejudicada pela decisão de prescrição, decisão essa que é aqui parcialmente revogada.
Este conhecimento deverá ser efectuado, se possível, pelos mesmos juízes, nos termos dos arts. 665º, nº 2 , 679º a contrario e 683º, nº 1, aplicado este último analogicamente.
É que o regime de substituição previsto para a Relação no nº 2 do art. 715º do revogado Código de Processo Civil que era aplicável ao Supremo Tribunal de Justiça – segundo jurisprudência não uniforme -, por força do disposto no art. 726º do mesmo revogado diploma legal, foi alterado, não se aplicando agora esse regime de substituição ao Supremo Tribunal – cfr. art. 679º.
Pelo exposto e por fundamentos diversos, concede-se parcialmente a presente revista e se revoga o acórdão recorrido na parte em que considerou prescritas as prestações aqui peticionadas pagas pela recorrente aos familiares da vítima do acidente em causa, dentro do período de tempo de três anos contado imediatamente antes de 18-07-2012 e as que foram pagas depois desse período e abrangidas pela ampliação do pedido efectuada a fls. 598 dos autos, mantendo-se a decisão de prescrição decretada no acórdão recorrido no que toca às prestações pagas pela recorrente antes do período de tempo de três anos mencionado.
Como a autora não discriminou o tempo exacto em que pagou cada uma das prestações, haverá, nos termos do disposto nos art. 609º, nº 2 e 358º, n 2 de ser efectuada a liquidação do montante do pedido que efectivamente não está abrangido pela prescrição, no caso de a Relação não dar acolhimento à outra causa de impugnação da apelante.
Os autos voltarão para a Relação a fim de pelos mesmos juízes, se possível, seja conhecido da questão levantada pela apelante sobre a excepção peremptória consistente na limitação da obrigação ressarcitória da apelante.
Custas da revista pela recorrente e recorrida em partes iguais.
As custas da apelação e da 1ª instância deverão ser atribuídas pela Relação de acordo com o que vier a ser decidido na futura decisão da apelação.
2014-05-13
João Camilo ( Relator )
Fonseca Ramos
Fernandes do Vale.
Comentários
Enviar um comentário