DESPACHO DE DEFERIMENTO LIMINAR E DESPACHO DE CONCESSÃO


Para além da filosofia subjacente ao instituto em causa, haverá que observar o modo como o mesmo se encontra configurado no CIRE.


Tal procedimento apresenta dois momentos de apreciação distintos por parte do tribunal – um despacho inicial que incide sobre a sua admissibilidade (despacho de indeferimento liminar ou “despacho inicial” a determinar o prosseguimento – arts. 238º e 239º) e a decisão (final) de exoneração (art. 244º).

O despacho liminar destina-se a aferir da existência de condições mínimas para aceitar o requerimento contendo o pedido de exoneração, sendo que o juízo de mérito em causa não é sobre a concessão ou não da exoneração (análise que só será efectuada passados cinco anos), mas em aferir o preenchimento de requisitos, substantivos, que se destinam a perceber se o devedor merece que uma nova oportunidade lhe seja dada.

E, como refere Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, o despacho inicial não representa qualquer decisão relativamente à concessão da exoneração do passivo restante, representando apenas a passagem a uma nova fase processual, denominada período de cessão, onde o devedor é sujeito a determinadas exigências durante cinco anos, findos os quais o juiz tomará decisão final sobre a concessão ou não da exoneração (art. 244º).

Ou seja, haverá que distinguir claramente entre os requisitos da exoneração definitiva e os requisitos da admissão do pedido que se destinam tão só a permitir a sujeição do devedor a um período de prova, findo o qual, aí sim, o tribunal proferirá um juízo de valor sobre se o seu comportamento durante os cinco anos foi de molde e merecer a concessão do benefício.

O despacho de indeferimento liminar encontra-se regulado no art. 238º e pode fundamentar-se em razões de ordem formal ou processual (apresentação fora de prazo – al. a) do nº1, do art. 238º) ou em razões de ordem material ou substantiva (mérito ou comportamento do devedor – alíneas b) a g), do nº1 do art. 238º).

Quanto ao conteúdo e requisitos a que deve obedecer o pedido do devedor, o nº3 do art. 236º do CIRE, apenas exige que, no requerimento de apresentação à insolvência, o devedor pessoa singular que formule o pedido de exoneração do passivo restante, nele faça constar expressamente a declaração de que preenche os requisitos e se dispôe a observar todas as condições exigidas nos artigos seguintes.

E que a insuficiência da massa insolvente – quer seja reconhecida aquando da declaração de insolvência (art. 39º), quer mais tarde, para efeitos de encerramento do processo de insolvência nos termos do art. 232º do CIRE – não é impeditiva ou não obsta à admissibilidade do pedido de exoneração do passivo restante, inferir-se-á do nº8 do art. 39º do CIRE.

Com efeito, prevendo tal norma que, concluindo o juiz que o património do devedor não é presumivelmente suficiente para a satisfação das custas do processo e das dívidas previsíveis, seja proferida sentença com efeitos limitados, excepciona-se no seu nº 8 o caso de, sendo o devedor uma pessoa singular, ter requerido anteriormente à declaração de insolvência a exoneração do passivo restante.

Por outras palavras, aí se estipula que, se o devedor tiver requerido a exoneração do pedido restante, o reconhecimento da insuficiência da massa insolvente antes da datada prolação da sentença declaratória não importará a declaração de insolvência com efeitos limitados nos termos previstos no art. 39º, devendo, em tal caso, ser proferida sentença de declaração de insolvência nos termos e com os feitos previstos no art. 38º.

Ou seja, o próprio legislador, ao prever a hipótese da insuficiência da massa insolvente, não encontrou qualquer incompatibilidade entre aquela e a dedução do pedido de exoneração do pedido restante, não a considerando impeditiva da dedução deste pedido.

Concluindo, o valor diminuto ou a inexistência de património apreensivel para a massa, com o consequentemente encerramento do processo ao abrigo do art. 232.º, não constitui factor impeditivo de o devedor se candidatar à concessão do beneficio de exoneração do passivo restante.

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